Bicho de 7 Cabeças




Seu Wilson e seu filho Neto possuem um relacionamento difícil, com um vazio entre eles aumentando cada vez mais. Seu Wilson despreza o mundo de Neto e este não suporta a presença do pai. A situação entre os dois atinge seu limite e Neto é enviado para um manicômio, onde terá que suportar as agruras de um sistema que lentamente devora suas presas. 
Esse filme é muito especial pra mim. Não somente por retratar a dificuldade de relacionamento entre pai e filho e sim a coragem em retratar o caos que é o "tratamento psiquiatrico nos manicômios". Em uma cena o Doutor Sintra(Psiquiatra Resp.) recebe um telefonema que informa o possível cancelamento da verba para o Hospital. Caso ele não consiga mais internos. Logo, ele cita que buscará mais pacientes debaixo de algum viaduto da cidade.   
O equilíbrio mental dos pacientes não é prioridade e miseráveis podem ser trancafiados no hospício, o repasse do governo para clínicas abarrotadas é que não deve ser perdido.

Parece mesmo que “Bicho de Sete Cabeças”, dirigido por Laís Bodanzky,com roteiro de Luiz Bolognesi baseado no livro autobiográfico de Austregésilo Carrano Bueno, Canto dos Malditos é um filme de valor social. Existem pessoas que acreditam que o filme foi um dos principais propulsores da implantação da Lei Paulo Delgado, que ainda assim teve sua cláusula essencial alterada, após 12 anos de sua elaboração( ou seja na realidade muito pouco mudou).

Eletroconvulsoterapia; medicamentos tranqüilizantes; injeções aplicadas grosseiramente; reclusão em locais exíguos, insalubres e fétidos ― procedimentos aplicados de modo desordenado, muito além dos 84 minutos muito bem filmados por Bodanzky. Neto (Rodrigo Santoro) é o típico louco “fabricado” pelos próprios métodos classificados como sanativos nos arredores da psiquiatria dos anos 1990 (Bodanzky quis alertar o espectador, situá-lo na atualidade), vista como uma inequívoca forma de política pelos mais analíticos.
 O filme aborda questões sociais como os abusos sofridos pelos pacientes dos hospitais psiquiatricos cometidos pelos medicos e funcionários desses locais, a questão das drogas e a relação problemática entre pai e filho. Essas abordagens renderam críticas positivas sobre o filme e fizeram com que as pessoas repensassem antes de internar seus filhos em alguma instituição.

 Carrano se refere às instituições como "chiqueiros psiquiátricos", e quando perguntado a ele se Bodanzki fizera uma adaptação fiel de seu texto, ele respondeu:


"Acho que o filme ficou na dosagem certa, embora não passe nem 10% do que nós pacientes psiquiátricos passamos dentro desses chiqueiros psiquiátricos, que ainda hoje são verdadeiras "casas de extermínio". Quando comparo essas instituições do terror com casas de extermínio, não é só pelo fato de 80% dos internos morrerem ou virarem moradores lá dentro, mas também pela prisão física e química às quais somos submetidos, ou seja, uma morte em vida que nos leva ao zumbinismo."
 De acordo com o raciocínio do jornalista Luiz Carlos Maciel no jornal O Pasquim em janeiro de 1970, um ex-interno não é mais humano, como estabelece a moralidade vigente mais ou menos definitivamente. Com Neto não é diferente, apesar de sua repelência ter sido pouco abordada, mas pode ser ainda pior. Como louco fabricado, no domínio da doença adquirida e consequentemente punido pelo próprio psicológico, ele está impedido de adaptar-se à sociedade que voluntariamente se omite e acaba voltando ao pesadelo dos hospícios. É revoltante concluir que ele entrou normal e saiu perigosamente alterado. Foi “tratado” para ser um excluído.

Neto faz apelos constantes para sair do manicômio e são encarados como táticas de um "viciado" que pagaria qualquer preço para retornar ao convívio com as drogas, o que só faz com que se prolongue sua internação. Quando consegue sair, passa a conviver com o preconceito dos outros e tem dificuldades de readaptação que o levam a incorrer em novos erros e descaminhos, levando-o a nova internação.Como escapar desse vai e vem?  O que nós podemos fazer?Sensibilidade é uma das palavras essenciais nessa relação delicada. Compreensão e diálogo também fazem parte do caminho da recuperação. Neste caso a recuperação(ou inicio dela) seria a BOA relação entre pai e filho (lembrando que Neto não era um viciado convicto).

Este filme possui 2 vertentes ficção e drama familiar vs documentário que ilustra e muito bem, a dura e ainda presente realidade da situação manicomial.Creio que algumas instituições ainda sigam a seguinte porcentagem:  solitária, camisa de força, eletrochoque e medicamentos como 90% do tratamento.  Inclusão do paciente ao cotidiano e  extinção do desprezo resultam em 10%.
"Pai, as coisas são boas quando a gente esquece.
Mas, eu ainda não esqueci o que você fez comigo.
Lembra da frase que você disse:
Eu cheguei onde cheguei.
Quero ver onde você vai chegar?
Pois é Pai...cheguei aqui. Aqui é meu lugar.
Seu mundo aí é fora não é mais pra mim"  Neto em sua carta ao Pai
Movimento Antimanicomial - Acesse
Movimento Antimanicomial





2 comentários:

  1. Falta muito para que o sistema psiquiátrico seja ideal, ainda mais perante situações como manicômios do estado... um total descaso! O filme é perfeito em retratar o lado mais pesado e esquecido da sociedade.. ótima pedida! ;D

    ResponderExcluir

"O cinema não tem fronteiras nem limites. É um fluxo constante de sonho." (Orson Welles)

 

Instagram

Seguidores

Fanpage